segunda-feira, 27 de julho de 2009

A "ignorância" torna as pessoas mais felizes?



Pesquisador italiano afirma: quem estuda mais tende a se sentir mais frustrado, por não conseguir atingir o sucesso que supõe merecer

Uma carreira de extremo sucesso é o sonho natural de quem frequenta uma universidade e encara os livros com dedicação. Mas ele nem sempre se realiza. Paralelamente, um operário que consiga sustentar os filhos pode tirar do trabalho muito mais satisfação, já que estudou pouco e tinha baixas expectativas. "A ideia de que a evolução na carreira e o aumento das possibilidades de consumo invariavelmente contribuem para um maior bem-estar é consenso na economia. Mas não tem muito suporte na psicologia", afirma o economista italiano Francesco Ferrante, da Universidade de Cassino, na Itália. Para Ferrante, quanto mais educação, maiores as expectativas do trabalhador - e também maior a frustração, caso esses sonhos não se realizem. "De fato, a educação e o acesso a ambientes estimulantes podem ter um efeito perverso na satisfação com o trabalho".

Na pesquisa (com italianos), as declarações de alta satisfação com a vida aumentam até os 10 anos de escolaridade, e caem entre aqueles que estudaram mais que isso. As declarações de baixa satisfação com a vida atingiram seu pico entre aqueles com 15 anos ou mais de escolaridade.

O economista explica que, à medida que o trabalhador encontra mais oportunidades de escolha em relação ao trabalho, torna-se mais pressionado por dúvidas e concessões a fazer. O problema, de acordo com Ferrante, é que, ao fazer qualquer escolha, há sempre a possibilidade do arrependimento. "Quando as possibilidades aumentam, nossos padrões para o que é aceitável também se elevam. E quando o resultado não é o esperado, fica a frustração, porque havia inúmeras outras possibilidades que não foram escolhidas", diz o pesquisador. Ao mesmo tempo, o trabalhador com pouca instrução, sem muitas possibilidades no emprego, pode encontrar satisfação apenas por ter seu dinheiro garantido.

O economista não questiona, porém, o valor da educação. Ele a considera uma importante variável para a satisfação pessoal e profissional. A educação alarga o horizonte e as possibilidades pessoais e profissionais - como trabalhar em um outro país, receber salários polpudos ou montar um negócio bem-sucedido. O que o Ferrante mostra, porém, é que a abordagem puramente técnica da relação entre educação, trabalho e satisfação não contempla as nuances psicológicas do homem, com seus conflitos internos e desejos, que mudam de acordo com as realizações. Algumas poucas vitórias são suficiente para inflar ambições, que podem se tornar inacessíveis e, assim, gerar insatisfação.


Gráfico acima mostra o nível de satisfação ao longo da vida (idade/satisfação)

Ferrante também detectou, com base em estatísticas do censo italiano, que a satisfação profissional dos bem educados muda ao longo da vida. "A [curva da] satisfação tem formato de U", afirma. No início da carreira, o contentamento com as conquistas acadêmicas e o mundo de possibilidades profissionais garantem a felicidade do trabalhador. Na maturidade, ele sofre ao perceber que muitos sonhos não serão realizados (essa fase chega por volta dos 55 anos para os italianos, mais tarde do que em outros países, segundo Ferrante). No final da vida produtiva, vem a aceitação das vicissitudes, e as pequenas conquistas recebem um olhar mais carinhoso. O pesquisador também nota que as mulheres são mais satisfeitas que os homens, devido a restrições que recebem em sociedades ainda machistas. Apesar de ter sido realizado com base na população italiana, Ferrante acredita que suas percepções são universais. O estudo foi apresentado na conferência internacional "Economia Comportamental, Psicologia Econômica: Teoria e Política", em Halifax, no Canadá, no mês passado.

(Fonte: Revista Época)


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